segunda-feira, 16 de março de 2009

O Rio Grande rumo às trevas

Publicada n'O Taquaryense em 25 de março de 2006.

Fidel, no ano passado eu falei sobre o campeonato de futebol do Sobril Meridional, um estado do fictício Sobril, país cuja bandeira ostenta o mote “Com jeito vai” escrito sobre uma banana. Por causa de um atentado à língua perpetrado no regulamento do campeonato, não deram o título ao legítimo campeão, o XXX de Fevereiro, mas ao Multinacional.

Tudo no Sobril é parecido com o Brasil, só que diferente. Eu achei que seria divertido inventar essa história para contar um causo real. E não é que eles fizeram de novo? Agora eu me obrigo a falar do Brasil, mesmo, e do Rio Grande do Sul e seu campeonato de futebol.

Na verdade, leitor não afeito ao esporte bretão, o assunto não é futebol, mas educação – a parte que se ensina na escola. No ano passado, não deram a taça ao legítimo campeão gaúcho, o XV de Novembro de Campo Bom, porque o regulamento não fazia sentido e estava escrito num “português” (entre aspas para não ofender a língua pátria) tão esdrúxulo que o XV desistiu.

Bueno, fizeram de novo. Eu gostaria de estar errado, Fidelito. Quem sabe o regulamento legítimo foi violado por um terrorista da língua, que esparramou vírgulas como quem joga milho às galinhas. Porém, temo estar certo.

Não são só as vírgulas. A lógica e o encadeamento de idéias são tão tortos que custaria um grande poeta para inventar algo tão ruim, se quisesse. É ruindade natural. Está lá, no sítio da Federação Gaúcha de Futebol.

O Rio Grande do Sul foi o primeiro estado do Brasil a ter escola. Costumava ser referência nacional em educação – melhor do que o centro do país e muito melhor do que o Norte, Nordeste ou Centro-Oeste. Gerou poetas e romancistas importantes, mas finalmente encontrou, ao que parece, sua vocação: o analfabetismo funcional.

Volto ao Sobril, Fidel: contei da visita, no ano passado, a Cais Jovial, leal e valerosa capital do estado sulista. Falei do meu pasmo ao circular pelo bairro Cidade de Pedra e ver placas de “sentido obrigatório à esquerda” onde deveria ser “proibido virar à direita”.

Só que eu não sabia que a estupidez sinalizatória estava espalhada por toda a cidade. Perdi a capacidade de contar fábulas: era Porto Alegre, mesmo. Era Petrópolis. E me apavorei mais um pouco quando andei por algumas cidades do interior e constatei que a moda lá chegou. São placas de trânsito que comandam os gaúchos ao suicídio, pois, em avenidas largas, elas dizem: “na próxima esquina, tu és obrigado a virar à esquerda, mesmo que tenhas que te atravessar na frente de um ônibus lotado, um caminhão e um fusca, porque eu tô mandando”.

É engraçado, Fidelito. Eu conheço gaúchos cultos. Alguns até lêem livros. Há, entre os políticos, vários intelectuais. Há, entre os professores e até estudantes, vários que conseguem formar uma frase com sujeito, verbo e complemento, com concordâncias acertadas e regências apropriadas. Porém, hoje estou desanimado, com a impressão de que todo mundo foi aluno do professor Tapir Hirsuto.

Daí, dá uma gastura, uma dor no estrombo, uma vontade de comer melancia com uva até perdê a indentidade e batê as bota. E pra não dizê imporpérios, palavras de baixo escalão, pra não estrupar mais a língua portugueza, vou escolher umas palavras menas grávidas para mim berrar até se esgüelar: NÓIS TEM POBREMA!

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