sábado, 28 de março de 2009

Tem que ser macho

Publicada n'O Taquaryense em 1 de julho de 2006.

Fidel, quero falar mais sobre o Sobril, o país fictício de nome inspirado no sobro, uma corticeira que havia em sua costa. Mais ou menos o oposto do Brasil, já que o pau-brasil é incorruptível e duro, segundo o Aurélio.

Pois no Sobril há uma gente nostálgica que se apoquenta com a decadência dos costumes. Eles dizem coisas como “é o fim”, “não tem mais home no Sobril”, “no meu tempo, fio de bigode valia como contrato; hoje, nem papel reconhecido em cartório põe limite nos velhacos”.

Cá para nós, Fidelito, eu acho meio esquisito esse papo de “ser home”, pois honestidade e caráter não têm gênero. Mas, que seja. Vou contar uma história de macheza que recentemente impressionou os cidadãos do Sobril.

O presidente, de origem octária, era querido pelo octariado (que é como eles chamam o povo). Mas a casa começou a cair quando um chupim governamental de n-ésimo escalão apareceu na TV embolsando dinheiro e dizendo que era fácil roubar. O chupim virou caranguejo – um ladrão foi fazendo aparecer outro, e outro, e outro... Não que tenham puxado todos os ladrões, digo, caranguejos do balde, mas foi um montão.

Lá pelas tantas, Fidelito, já não tinha balde para caber tanto caranguejo: era amigo, era parente, era nego carregando dinheiro na cueca, até adversário político – a coisa ficou perigosa, os mais afoitos já gritavam que todo mundo era caranguejo. Mas não era nada disso, porque todos esses caranguejos aí traíram ele – o presidente, que não sabia de nada (este parágrafo se presta a leituras dramáticas com várias entonações, especialmente neste final).

Mas, calma, que eu chego na história de macheza. O negócio continuou, caranguejo enganchado em caranguejo, até que apareceu um crustáceo grande, que não se esperava: o zagueiro-central do time do presidente. O sujeito da retaguarda, uma espécie de Figueroa, para quem é mais antigo (não existem exemplos atuais; se eu falar nos irmãos Pontes do Gaúcho de Passo Fundo, é a mesma antiguidade).

Pois o becão do governo sobrileiro fora visto e revisto numa casa de tolerância da capital do país – casa essa que era um laboratório de pesquisa em sacanagem. Sabes como é, Fidel? Lá eles desenvolviam e experimentavam novos tipos de sacanagem da braba. Tecnologia de ponta, mas era coisa que dava cadeia.

Vai daí que o caseiro da casa de tolerância viu nosso herói muitas vezes lá, e foi chamado a dar testemunho frente aos nobres representantes do povo sobrileiro. Era para dizer se viu mesmo o zagueirão lá, quantas vezes, com quem, que tipo de sacanagem fazia...

Mas eis que se levanta um membro (ops!) do Judiciário sobrileiro para salvar nosso herói. Com a mais esfarrapada das desculpas, o desembargador exarou (Fidelito, é estranho como soa este verbo; posso ver os magistrados gracejando: ‘- Que crime hediondo! Vossa excelência exarou? - Eu não! Quem exarou foi vossa excelência, que falou’) que o caseiro não iria falar porque era ignorante, e caso encerrado.

Cabra macho! Ou eu não entendi, Fidel, ou ele chamou o presidente de burro, pois o caseiro era até mais instruído que o presidente. E ainda por cima caçoou dos seus colegas ingênuos que se preocupam em zelar pela própria reputação. Dar uma sentença estapafúrdia e ainda sugerir que o presidente devia calar a boca? Ala fresca! Mas que baita macho!

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