sábado, 6 de dezembro de 2008

Empreendedores

Publicada n'O Taquaryense em 11 de setembro de 2004.

É um admirável mundo novo, Fidel. Olha o que fizeram quatro garotos de Cincinnati, de 18 e 19 anos: ligaram seus computadores em rede com antenas de satélite, uns pratões de 3 m de diâmetro e andaram pela vizinhança captando conexões internet sem fio desprotegidas. Bateram nas portas das casas e se ofereceram para proteger as informações. Ante o olhar aterrorizado dos visitados, desconfiaram que o negócio não ia dar certo. Pelo contrário, podia até pintar polícia na parada.
Só que um deles tropeçou no sítio (sim, Fidelito, eu não sou xenófobo, dou meu OK para software e hacker, mas delivery e site não dá) da DefCon, uma conferência de hackers em Los Angeles. Faltavam só 19 dias.
Havia um prêmio para a conexão sem fio mais distante. O pai de um deles, engenheiro, espantou-se com a qualidade dos resultados. Outro pai levou-os pessoalmente de Cincinnati a Los Angeles, arrastando um trailer com a parafernália por quase 3500 km.
Foram lá e ligaram 2 computadores distantes 55 milhas (88 km), o que é um recorde mundial para pontos no solo. Mais assombroso, desligaram a amplificação de sinal e a conexão continuou ativa. Ganharam livros, medalhas e um passe vitalício para a DefCon, além da veneração uivante da grande tribo dos hackers.
Quem me conta a história é um dos meus gurus tecnológicos, da mesma idade dos quatro premiados. Achei inspirador, heróico. Mostra a atitude típica dos empreendedores – curiosos, movidos pela vontade de fazer, focados em soluções, não em problemas.
Pipocam empreendedores por aí. É gente que gera negócios, mas também já existe espaço para empreendimentos cujo produto não tem que dar lucro. Um exemplo brasileiro de fama mundial é o Rodrigo Baggio, que criou o Comitê para a Democratização da Informática. Começou no Rio, levando o computador às favelas. Foi reconhecido pelo mundo, recebeu até título de doutor honoris causa de uma universidade norte-americana. Ah, o leitor não ouviu falar de Rodrigo Baggio? Pois é, isso não aparece muito, parece que não é notícia.
Dá para empreender em praticamente qualquer coisa. Conheci uma professora de Matemática porto-alegrense, num congresso no estrangeiro, que criou um método para ensinar fatoração, aquela técnica de simplificar expressões que tanta gente vê como um bicho-de-sete-cabeças. Ela deduz as fórmulas com tijolinhos. Com retângulos e paralelepípedos com arestas de tamanhos simbólicos como a, b, x e y, ela mostra por que (a+b)*(a-b)=a2-b2 e outras sacações que muita gente decora na escola sem entender bem o espírito da coisa.
Há um empreendedor em cada um de nós, Fidel. Até naquele vizinho que esganiça além da capacidade auditiva humana o som do carrão que ganhou do papai (já que sabe desenhar o próprio nome e agora se prepara para ser doutor). Ao contrário do que pensas, ele não é um cretino arrogante e mal-educado. É só um potencial empreendedor brincando com as suas engenhocas. Um dia desses o espírito curioso desabrocha e ele vai revelar o gênio interior. Tu vais ver. Espera só.

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