sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Pela emancipação masculina

Publicada n'O Taquaryense em 14 de agosto de 2004.

Caro Fidel, venho rogar teu apoio num assunto que muito interessa a nós, representantes de um sexo em extinção. Vimos acompanhando ao longo dos anos a trajetória feminina rumo à emancipação, mas nós barbados não acompanhamos o progresso, não evoluímos de acordo.
Longe de mim ser contra a alforria mulheril, logo eu que já opinei sobre os matrimônios de antanho, ritos de transferência patrimonial. Também não quero minar tua autoconfiança, justo agora que engataste um namoro firme. Mas o fato é que estamos perdendo a parada.
Enquanto as mulheres jogaram o trabalho de casa para os eletrodomésticos e ganharam a rua, tudo isso sem perder regalias como a aposentadoria precoce, a licença-maternidade e a atenuação dos crimes hediondos cometidos durante a TPM, nós perdemos o poder e ganhamos o quê? O controle remoto da TV?
Falta-nos liderança, mas não sou candidato nem conheço alguém habilitado e disposto. Urge, porém, recuperar o orgulho macho e o exercício das atitudes que melhor nos definem: coçar as partes baixas em público, fazer um trilho com a roupa suja a caminho do chuveiro, falar “Sair com esta minissaia, uma ova!” e outras transcendências características do másculo.
Vamos reaver nossa glória! Quero sugerir um símbolo para a nova era: a pochete, esse pretexto masculino para fazer o que toda mulher sempre teve direito: carregar um número indizível de bugigangas. Até índio grosso respeita – jamais percebi qualquer piadinha, insinuação ou sequer um arquear de sobrancelha relacionado ao porte da pequena bolsa presa à cintura (que lembra guaiaca, talvez por isso).
A pochete é uma redenção. Para provar, faço um inventário da quinquilharia que carrego: chaves do meu carro, do da patroa e outras dezenas (a metade eu não sei de onde), lapiseira-miniatura (bom quebra-galho), moedas, protetor labial (emancipar-se é não ter medo da frescura!), alicate de unha, um canivetinho cuja aparição providencial já me rendeu algum prestígio, esferográficas (azul, vermelha, preta), 7 talões de cheque (4 vazios, um de um banco do qual não sou cliente há 19 meses), receita de remédio para cachorro (só lembro que não precisou, mas não sei para quê), receita médica (preciso providenciar), guardanapos do restaurante onde almoço com importantes anotações de negócios (feitas há quatro meses), uma ficha do metrô de São Paulo e outra do Trensurb de Porto Alegre que duvido que funcionem, papéis e mais papéis com e-mails anotados (para os quais jamais enviarei mensagem) e a carteira – com documentos, uns pilas, cartões de crédito (já que é impossível cancelá-los), meu último cartão de visita, cartões de outros tipos, fotos 3x4 e mais papéis com e-mails, entre outras tralhas.
A pochete é uma quebra de paradigma. Sua ancestral, a capanga ou perde-tudo, foi inspirada na bolsa feminina, com alça. A pochete não. Fica ali, encimando o saco e não nos requer lembrar nem ocupar as mãos. Sua elevação à categoria de símbolo da emancipação masculina é minha modesta contribuição. Além disso, hoje em dia usar pochete é uma coisa normal. Baguais do mundo, uni-vos!

Nenhum comentário: